Artigo | A Primeira Noite de um Homem: uma ousadia há 51 anos

Ao assistir A Primeira Noite de um Homem, possivelmente o jovem espectador millenial não entenda o impacto que o filme teve em seu lançamento, há 51 anos. Tanto na temática quanto pela escolha de um protagonista muito distante do que se considerava um lead man em Hollywood.

O jornalista Mark Harris, do Entertainment Weekly, em seu livro Cenas de uma Revolução, colocou a produção como uma das que mudaram a indústria cinematográfica americana, juntamente com Uma Rajada de Balas, No Calor da Noite e Adivinhe quem Vem para Jantar, todos produzidos e lançados na mesma época.

Anne Bancroft e Dustin Hoffman vivem um relacionamento conturbado

No caso de A Primeira Noite de um Homem, há o estilo emprestado do cinema de arte europeu, como identificou Guy Barefoot em seu texto para Tudo sobre Cinema, apostando na empatia com o público adulto jovem da época e a escolha de Hoffman como protagonista. A escalação é ainda mais ousada quando se sabe que Robert Redford queria o papel.

Entusiasmado com o roteiro, Redford garantiu ao diretor Mike Nichols que poderia interpretar o Benjamin Braddock que ele queria. O cineasta, judeu como Hoffman e que havia fugido da Alemanha ariana de Hitler, respondeu: “Bob, se olhe no espelho. Você honestamente se vê como um cara que teria dificuldade em seduzir alguém?”.

Hoffman, além de baixinho e narigudo, era um ator que vinha de alguns papéis off Broadway, pequenas participações na TV e uma ponta no cinema. Mas, apesar de ser apenas seis anos mais jovem que Anne Bancroft, cuja personagem era amiga de seus pais e mãe de sua futura amada (interpretada por Katherine Ross), convenceu perfeitamente como o jovem sem perspectiva de vida que se deixa seduzir pela mulher mais velha e casada. A química com Anne pode ser sintetizada na frase que está entre as mais famosas de Hollywood: “Mrs. Robinson, você está tentando me seduzir?”.

Mrs. Robinson, por sinal, é um das duas das canções da dupla Simon & Garfunkel que integram a trilha musical do filme, sendo a outra, “apenas” The Sound of Silence. A Primeira Noite de um Homem recebeu sete indicações ao Oscar, incluindo Filme, Ator (Hoffman), Atriz (Anne Bancroft, que já tinha ganho um), Atriz Coadjuvante (Katherine Ross) e Roteiro Adaptado; mas só o diretor Mike Nichols levou a estatueta para casa.

Katharine Ross e Dustin Hoffman em cena do clássico

Se não ganhou muito dinheiro com o papel – descontando os impostos, sobraram US$ 4 mil de salário – Hoffman estabeleceu um novo paradigma em Hollywood (sem ele, talvez não houvesse Al Pacino em O Poderoso Chefão, por exemplo) e acabou se tornando um dos atores mais respeitados e premiados do cinema. Anne Bancroft se divertiria nos anos seguintes dizendo que jovens rapazes a abordavam para dizer que ela havia sido sua primeira fantasia sexual.

Katherine Ross, dois anos depois, estrelaria outro clássico, Butch Cassidy e Sundance Kid, em que fez par romântico com o mesmo Robert Redford, que aspirava ser seu parceiro em A Primeira Noite de um Homem. Mike Nichols, por outro lado, que vinha do sucesso Quem tem Medo de Virginia Wolf?, nunca mais chegaria perto do grande sucesso de público e crítica que lhe rendeu o prêmio da Academia.

Marcos Kimura http://www.nerdinterior.com.br

Marcos Kimura é jornalista cultural há 25 anos, mas aficionado de filmes e quadrinhos há muito mais tempo. Foi programador do Cineclube Oscarito, em São Paulo, e técnico de Cinema e Histórias em Quadrinhos na Oficina Cultural Oswald de Andrade, da Secretaria de Estado da Cultura.

Programa o Cineclube Indaiatuba, que funciona no Topázio Cinemas do Shopping Jaraguá duas vezes por mês.

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