Há muito tempo atrás (40 anos, para ser mais exato), uma tela preta, algumas letras coloridas, uma música forte e marcante, depois mais letras coloridas, e a música abaixa, e em seguida vem um letreiro, correndo a tela de baixo para cima, explicando uma história confusa que envolvia uma guerra interplanetária em outra galáxia… E nascia ali um dos maiores, se não o maior fenômeno mercadológico da história do cinema – e para muito além dessa barreira. Star Wars não foi o primeiro blockbuster, pois alguns anos antes uma história envolvendo um certo Tubarão mudou a maneira de se pensar cinema para as massas (e não estou falando do Tutubarão); mas com certeza a cria máxima de George Lucas ajudou a consolidar o termo, e mais do que isso, ajudou a criar uma nova maneira de se vender o cinema para além das telonas – Star Wars está para o merchandising relacionado à sétima arte assim como a Tubaína está para os refrigerantes bons.
Mas quando paramos para analisar como tudo isso começou, lá na década de 70, chega a parecer estranho, pra não dizer contraditório, o fato de George Lucas querer fugir das mãos da indústria, tendo pra isso criado a Lucasfilm onde poderia ele mesmo ditar as regras do que queria fazer, e logo depois com o sucesso de seu filme (que só depois disso se tornou saga) ter se deleitado de forma voluptuosa na própria indústria que criticou, abarcando ainda um novo mercado à época – o de licenciamento de produtos.
Você não via mochilas do Charlie Chaplin, canecas dos irmãos Lumiére ou mesmo almofadinhas com estampas de casais embalados em cenários de Casablanca. Mas a história do caipira que salvou o universo (não, não é o Ernest nem o Crocodilo Dundee) abriu as portas para que as pessoas pudessem carregar e ostentar seus personagens favoritos fora do cinema também, dado o tamanho do fenômeno que foi Star Wars.
Vindo de uma frutífera safra/escola de diretores (teve como contemporâneos e amigos gente do calibre de Francis Ford Coppola, Steven Spielberg, Martin Scorsese e Brian DePalma), George Lucas começou a trabalhar com cinema logo após se formar na faculdade, onde teve como coleguinha de sala Coppola. E olha que bem mais do que alguém com quem ele dividia o lanche, o diretor de Poderoso Chefão foi um dos responsáveis pelo primeiro longa-metragem de sucesso de Lucas sair do papel em 1973: Loucuras de Verão, seu segundo filme, mas o primeiro sob a batuta de sua recém-fundada produtora, a Lucasfilm, só conseguiu ser financiado por um estúdio devido a forte influência de Francis – que além de sócio na primeira produtora de Lucas, a American Zoetrope, havia se tornado muito influente em Hollywood graças a saga dos Corleone.
O filme foi um sucesso de critica e público, conseguindo inclusive cinco indicações ao Oscar e revelando para o mundo um ainda ator Ron Howard, e um futuro grande astro das telonas, Harrison Ford. Estava aberto o caminho para que George Lucas pudesse alçar voos maiores como desejava.
Sua grande paixão eram os filmes experimentais, o que fica bem claro no seu primeiro projeto, ainda pela American Zoetrope: THX 1138. Um filme sobre uma distopia autoritária futurista que fugia, e muito, do que faria Lucas famoso alguns anos mais tarde. Esse filme de 1971 tratava de um sistema totalitário onde a população era controlada por robôs sem rosto, e tomava alguns remédios para se manter sob controle, um grande amálgama de obras literárias como Admirável Mundo Novo e 1984, que serviu de inspiração para filmes mais recentes como Equilibrium.
Caso você tenha prestado atenção ao nome desse filme, eles traz consigo algumas curiosidades: a sigla THX posteriormente virou o nome de uma famosa tecnologia de som desenvolvida pela Lucasfilm para o sexto episódio da saga Star Wars. Vai me dizer que você nunca se assustou no cinema ao ouvir aquele som no início dos filmes?
Além disso, a sigla e a sequência numérica 1138 apareceu por diversas vezes nos filmes da hexalogia original, fosse em capacetes de soldados, ou número de cela na nave em que Leia se encontrava sob o controle de Vader no Episódio IV.
Aliás, falando em “Episódio IV”… vocês sabiam que, originalmente, o filme não tinha esse subtítulo? pois é: em 25 de maio de 1977, quando foi lançado, o primeiro filme da franquia se chamava apenas Star Wars – ou Guerra Nas Estrelas, como ficou conhecido aqui em terras brasilis. Nada de numeração que indicasse a posição cronológica do filme numa suposta linha temporal. Mas aí, três anos depois, veio o segundo filme já com o nome completo de Star Wars – Episódio V: O Império Contra-Ataca – subtítulo que não apareceu em nenhum material promocional do filme, apenas em seus créditos, deixando muita gente confusa sobre o que se passava. E aí, em 81, nosso amigão George (não o Rei da Floresta) decidiu relançar o filme de 77, agora incluindo nele os subtítulos que todos nós conhecemos e amamos, Episódio IV: Uma Nova Esperança.
Também foi deixado de lado o uso do nome Guerra nas Estrelas, mas apenas com a estreia da “nova” trilogia em 99. Questões mercadológicas – Star Wars era um nome/marca forte no mundo todo, porque tinha que ser diferente no Brasil, certo?
Só que foi difícil para George Lucas mais uma vez conseguir emplacar uma ideia sua entre os grandes empresários do ramo em Hollywood. Ele teve que lidar com muitas portas na cara e muitos não antes que alguma mão se estendesse em sua direção – algumas das negativas, inclusive, partiram de seus amigos Coppola e Spielberg, que não viam sentido algum naquela história de Cavaleiros Jedi, Força e tudo mais.
Seguindo em sua cruzada pessoal para dar vida ao universo que imaginou, George Lucas precisava agora de bons nomes para compor sua equipe. Foi aí que apareceram Mark Hammill, famoso galã da TV à época, Carrie Fisher para dar vida à Princesa Leia, três pessoas diferentes para encarnarem Darth Vader… Pois é, havia um corpo (o alterofilista David Prowse), um rosto (Sebastian Shaw) e uma icônica voz (James Earl Jones, a mesma voz original do Mufasa, pai do Simba em Rei Leão) dando vida àquele que é considerado um dos maiores vilões da ficção em todos os tempos – e que de quebra foi o primeiro personagem concebido por Lucas para o universo Star Wars.
E ainda se juntou ao elenco um velho conhecido de Lucas, mas ainda não tão conhecido do público – um jovem Harrison Ford que, depois de inúmeros testes de outros atores (para o papel foram cogitados nomes como Nick Nolte, Kurt Russel! e Al Pacino!!) acabou ficando com o papel de Han Solo, que ele queria que morresse logo no primeiro filme. Tio Lucas não pensou exatamente da mesma maneira, em especial depois que observou o grande apelo do personagem e seu carisma junto ao público.
Depois, houveram inúmeros impasses na produção: desde personagens que mudaram de seres verdes gigantes para anti-heróis espaciais (sim, estou falando do Han Solo mesmo), mulheres que se tornaram homens (Luke, que se chamaria Starkiller, seria ainda uma mulher, e depois um anão), até o desgaste gerado pelas longas sessões de filmagem que a produção exigiu. Mas a Força estava com George Lucas.
Assim, há exatos 40 anos era consolidado o conceito de filmes arrasa-quarteirão (blockbuster), aquelas obras cinematográficas que eram lançadas visando as multidões, e que conseguiam, com orçamentos inchados, faturar números astronômicos nas bilheterias – sem aquela pretensão de ser um cinema mais cult, visando ser algo mais pop, no sentido estrito da palavra.
Muito embora Lucas não tivesse certeza absoluta que seu filme faria sucesso o suficiente para ser uma saga cinematográfica, ele decidiu sim começar a história pelo meio, pois não acreditava que a tecnologia da época pudesse lhe servir para o que viria antes do ponto em que iniciou. Na verdade, a tecnologia da época não era muito útil, mesmo para contar a trama que contou, mas aí veio a inventividade do cidadão que fundou uma das maiores empresas de todos os tempos quando se fala em efeitos especiais: Industrial Light & Magic.
Só que o filme foi um sucesso absoluto de público, gerando aquela que foi a maior bilheteria do cinema por muitos anos (e a maior da trilogia original), e angariando também a crítica, uma vez que abocanhou alguns prêmios ao redor do mundo – dentre os quais um Globo de Ouro e sete Oscars. Na verdade, foram seis Oscars e mais uma estatueta honorária pela Edição de Som, que na época não tinha uma categoria especial na premiação. Deve ter ficado bem orgulhoso nosso meninão, hein?
Esse sucesso todo que George Lucas sequer achava que era verdadeiro (ele viajou para fora dos EUA após uma primeira bem-sucedida semana do filme nas bilheterias, voltando só duas semanas depois quando recebeu uma ligação de seus agentes confirmando que as pessoas realmente ainda faziam filas enormes para ver sua obra) foi o sinal verde para a Lucasfilm seguir em frente com os capítulos V (1980) e VI (1983). Mas dirigir essa primeira aventura foi trabalhoso demais para o cocriador do Indiana Jones, que teve hipertensão e complicações na saúde durante todo a filmagem. Assim, nos capítulos seguinte ele trabalhou apenas como escritor, deixando a cadeira de diretor para Irvin Kershner e Richard Marquand em O Império Contra-Ataca e O Retorno de Jedi, respectivamente.
Depois do primeiro filme, aconteceu muita coisa – seja o acidente com Mark Hamill duas semanas antes da estreia do primeiro filme, que lhe deu cicatrizes no rosto que tiveram que ser inseridas no personagem Luke Skywalker logo no início do Capítulo V; seja os problemas com orçamento que resultaram nos Ewoks, que em momento algum do filme são chamados assim. George Lucas voltou à direção da série na “segunda trilogia”, e já não alcançou os mesmos resultados de outrora – ao menos não com relação a crítica, pois tecnicamente e em questão de arrecadação, foram sucessos mais do que estrondosos.
Vem muito mais por aí, pois a Disney entende bem dessa história toda de merchandising, cinema e tudo mais. Mas que valha a lembrança de como tudo isso emergiu: há exatos 40 anos atrás, naquela data que hoje em dia é comemorado o Star Wars Day (além do 4 de maio, só pela brincadeira com o original em inglês May 4th soar parecido com May The Force) e o Dia da Toalha, chamado de Dia do Orgulho Nerd também em homenagem ao autor dos livros do Guia do Mochileiro das Galáxias, Douglas Adams. E que a Força continue com você – e comigo também, pois ao menos com a franquia, ela parece estar a pleno vapor.
Parabéns pela matéria! 🙂
Opa, muito obrigado pela visita e pelo comentário Larissa.
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