O Cineclube Indaiatuba orgulhosamente vai exibir O Poderoso Chefão em versão há pouco remasterizada em 4k no dia 12 de abril, que por coincidência é o aniversário deste crítico e co-criador dessa sessão cult. Até agora, ela foi exibida apenas nos grandes centros, em comemoração ao 50º aniversário desta obra seminal de Francis Ford Coppola. Depois disso, posso até me aposentar.
A posteridade é o maior juiz de uma obra de arte, e nesse aspecto o épico inspirado no romance de Mario Puzo é praticamente imbatível, tanto como obra-prima do cinema, como mitologia na cultura pop. É impressionante como o filme resultou tão bom, considerando os percalços que enfrentou até chegar às salas de exibição. Da escalação do elenco a contragosto do estúdio – que preferia Robert Redford como Michael Corlene e qualquer um ao invés de Marlon Brando – à própria localização histórica, que o produtor Robert Evans cogitou em ambientar na época contemporânea para economizar. Isso, sem mencionar as negociações com o Sindicato do Crime Organizado, que impediu o uso dos termos Máfia e Cosa Nostra nos diálogos. Mas, quando filme foi lançado, os wiseguys adoraram.
Foi uma proeza e tanto para um novato como Francis Ford Coppola, egresso da escola Roger Corman que havia se destacado como roteirista de Patton, Rebelde ou Herói? E fracassado como diretor de No Caminho do Arco-Íris, tardio veículo para Fred Astaire. Ele impôs sua visão tanto na escalação do elenco – que Stanley Kubrick considerava o mais perfeito – quanto em detalhes como a inclusão de Mario Puzo no título (Mario Puzo’s The Godfather, como ele faria posteriormente com Bram Stoker no seu Drácula) e o logo com a mão comandando os fios das marionetes.
Frases se inseriram na cultura contemporânea, como “Vou lhe fazer uma proposta irrecusável”, “Veja o que fizeram com meu filho!” (na versão dublada exibida pela Band em capítulos), “Deixe a arma, pegue o canole” (que vem à mente toda vez que degustamos a sobremesa siciliana) e a inesquecível frase que abre o longa: “Eu acredito na América”.
Marlon Brando ganhou o Oscar pelo papel e no mesmo ano entregou outra atuação monumental em O Último Tango em Paris. Mas Don Corleone o marcou tanto que em 1990, mesmo ano do lançamento de The Godfaher 3, fez uma paródia de seu personagem mais famoso em Um Nova na Máfia.
Muito mais do que um filme de gangsters, O Poderoso Chefão é uma metáfora do capitalismo americano e dos Estados Unidos em geral, principalmente se incluirmos as duas continuações, de 1974 (que alguns acham superior ao original) e o de 1990 (que muitos subestimam injustamente). É uma saga sobre poder, solidão e família, mas num sentido mais shakespereano que cristão. Uma obra de arte que meio século depois continua viva e a chance de assisti-la em tela grande é imprescindível a qualquer cinéfilo.
Inspirações reais
Don Vito Corleone é inspirado em diversos chefões do crime organizado, em primeiro lugar por Carlo Gambino, mas Marlos Brando disse que usou a voz de Frank Costello que ouviu durante as transmissões de seu depoimento ao Congresso Americano.
Michael Corleone tem traços de Lucky Luciano, embora deslocado no tempo e do fundados do Sindicato do Crime não ter herdado seu poder. Mas as ações frias e impiedosas, e o fato de carregar as marcas de uma surra reforçam o paralelo.
Mas não há dúvida que o mais controverso personagem da saga é Johnny Fontaine (Al Martini), nitidamente baseado em Frank Sinatra e sua notória proximidade com a Máfia. O próprio Mario Puzo negou, mas ainda assim ele foi insultado em público pelo cantor, que fez de tudo para impedir o lançamento do filme. No livro, as passagens com Fontaine são ainda mais idênticas à vida do Old Blue Eyes, mas o filme se concentra na suposta participação do crime organizado em sua escalação para o papel de Angelo Maggio em A Um Passo da Eternidade, que lhe rendeu o Oscar de Ator Coadjuvante e ressuscitou sua carreira. By the way, o poderoso e pedófilo chefe de estúdio Jack Wolts (John Marley) seria inspirado em Harry Cohn, da Columbia. Quando ele morreu, em 1958, ao ver no funeral lotado, o comediante Red Skelton teria dito “Isso prova o que Harry sempre dizia, dê às pessoas o que elas querem ver que elas comparecerão”.
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