MEGALÓPOLIS, MEGACATÁSTROFE
Finalmente assisti a um filme de Francis Ford Coppola no cinema! Mas, uma pena que tal ocasião tenha sido para esse Megalópolis. Claro que eu não almejava um novo O Poderoso Chefão (1972), só que eu também não esperava um novo Virgínia (2011).
Muito se fala na imprensa sobre o quão louvável é o fato de o cineasta ter vendido a própria vinícola para arcar com o orçamento milionário de sua obra atual, já que não conseguiu patrocínio de nenhum estúdio para esse projeto de décadas de desenvolvimento.
Eu olho para essa situação com pena, porque o filme não vai se pagar em bilheteria e também porque ele não teve um direcionamento coeso que um produtor executivo poderia dar ao diretor, aparando excessos e propiciando profissionais mais capacitados para botar suas ideias em prática.
BOA IDEIA, MÁ EXECUÇÃO
Francis Ford tem uma premissa autoral até interessante, mas se perde drasticamente ao torná-la realidade. É nítido que ele vislumbra uma atmosfera a la Jogos Vorazes (Gary Ross, 2012), pelas mãos de Baz Luhrmann (Elvis, 2022), com uma pitada de Alan Parker (Evita, 1996), porém, isso tudo acaba ficando só na provável intenção, mesmo.
Num mundo onde Nova York é Nova Roma, com hábitos que remontam o império de outrora, César (Adam Driver, de Ferrari, 2024) é um renomado arquiteto futurista, que tem o poder de parar o tempo e o intuito de moldar a cidade num mix dos designs de Roth Azulik e de Iris van Herpen.
Mas, sua visão entra em conflito com a do prefeito (Giancarlo Esposito, série Breaking Bad, 2009 a 2011), cuja filha (Nathalie Emmanuel, série Game of Thrones, 2013 a 2019) desenvolve um romance bastante insosso com ele.
OS INGREDIENTES DO DESASTRE
O roteiro se considera provido de uma inteligência que não tem, jogando citações filosóficas a torto e a direito, das bocas de personagens pessimamente desenvolvidas e ridiculamente interpretadas. Juntam-se estranha e desnecessariamente ao elenco: Jon Voight (Ali, 2002) e Dustin Hoffman (Rain Man, 1988), perdidos em figurinos cafonas e cenários de computação gráfica do século passado.
Nem os figurantes se salvam, emocionados demais num número de menos, em protestos que deveriam parecer grandiosos, mas que se vê que não tem quase ninguém, devido a má filmagem. Aliás, que falta faz uma direção de fotografia inspirada, com close-ups apropriados e uma edição dinâmica.
A não ser por uma sequência conceitual final, as cenas se excedem, não são cortadas em tempo e não são montadas num ritmo adequado. Tudo isso em meio a uma trilha sonora irritante, com narração pretensiosa e deslocada de Laurence Fishburne (John Wick 4, 2023), enfatizada por intertítulos toscos, que dividem a história em capítulos enfadonhos.
É difícil elencar a ordem de momentos constrangedores, se o do César com o rosto enfaixado gritando “Não, não, não!”, se o de uma boneca utilizada como bebê ou se os das aparições do Shia Labeouf (Ninfomaníaca, 2013), flertando entre sensualidade e excentricidade.
Ao menos ele abraça de vez o tom caricato do filme e não sente vergonha de assumi-lo, como a irritante Nathalie Emmanuel, mais sofrida do que protagonista de novela mexicana.
NEM TUDO É PERFEITO
A cereja do bolo foi eu ter que pagar mais caro numa sala vip de cinema, a única disponível, para poder desfrutar desse acontecimento, que ainda por cima tinha uma caixa de som estourada, levando a experiência ao dissabor do inferno.
Megalópolis nos mostra que cineastas geniais também são meros humanos e não estão isentos de pesar a mão e, às vezes, errar feio com isso; mostra também que é bom termos parâmetros do que é qualidade duvidosa, para não deixarmos de apreciar o que vale a pena quando nos deparamos com algo de alto nível, se só estamos acostumados a lidar com o melhor do que o cinema tem a nos oferecer.
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