Saíram os seis primeiros episódios da segunda e última temporada de Sandman, sendo que os demais saem dia 24 de julho. O seriado da Netflix é baseado na graphic novel de Neil Gaiman, uma das maiores criações dos quadrinhos, e que teve uma bela primeira temporada em 2022, adaptando principalmente Prelúdios e Noturno, Casa de Bonecas e parte de Terra dos Sonhos.

O terror dos quadrinhos é amenizado na série, mas acho aceitável para agregar novos públicos.

No decorrer desses três anos entre as duas temporadas, no entanto, o autor foi acusado de crimes graves envolvendo desde abuso sexual até tráfico humano, com diversas denunciantes diferentes.

Gaiman foi cancelado e a série reduzida a duas temporadas, sendo que o material existente na HQs seriam suficiente para até cinco.

Assim, se os primeiros três novos episódios adaptam o arco Estação das Brumas com muita fidelidade, a seguir, há um salto em relação a graphic novel, para que a série se concentre na história de Morpheus (Tom Sturridge) e seus irmãos, os Eternos: Morte (Kirby Howlett-Baptiste), Delírio (Esme Creed-Miles), Desejo (Mason Alexander Park), Desespero (Donna Preston), Destino (Adrian Lester) e Destruição (Barry Sloane).

Assim, do belo arco Um Jogo de Você – talvez o meu favorito – se resume a personagem Wanda (Indya Moore), muito em função da discussão da transição sexual.

Em Estação das Brumas, após uma reunião familiar, Morpheus decide voltar ao Inferno para resgatar sua ex-amante Nada (Umulisa Gahiga), a quem condenou por dez mil anos por rejeitá-lo.

Na primeira temporada, ele havia vencido e humilhado Lúcifer (Gwendoline Christie, a eterna Brienne de Tarth, de Game of Thrones), que prometeu se vingar.

Quando o Rei do Sonhar chega ao reino do Capeta, este anuncia que está fechando e esvaziando seu domínio, além de entregar a chave para seu inimigo (a “aposentadoria” de Lúcifer é a origem da série popular estrelada pelo filho de pastor Tom Ellis).

Rapidamente, Morfeu percebe a ameaça implícita contida no “presente” e prepara seu reino para receber os candidatos a proprietários do Inferno.

Procissão

Uma procissão de deuses e entidades bate à porta do novo castelos de Morpheus, entre conhecidos como Odin, Thor e Loki; até menos cotados como Ordem e Caos.

Entre eles se destacam os enviados do mundo das fadas, o hedonista Cluaracan (Douglas Booth, de O Destino de Júpiter) e sua irmã Nuala (Ann Skelly, de The Nevers).

É por meio dela que é contada uma das mais premiadas e lembradas histórias de Sandman, Sonho de uma Noite de Verão, em que William Shakespeare, em pagamento a Morpheus pela sua inspiração, apresenta sua peça homônima aos soberanos do Reino das Fadas, Titânia (Ruta Gedmintas) e Auberon (Royce Pierrerson), e também ao trickster Puck, que marca a volta à atuação de Jack Gleeson, depois de ficar famoso como o rei Joffrey de Game of Thrones (se um ator passar a ser odiado por causa de seu odioso personagem, é porque ele é bom).

A partir do fim de Estação das Brumas, o showrunner David S. Goyer e sua equipe de roteiristas têm que ser mais originais e reunir numa narrativa coerente diversas histórias dispersas para encaminhar a conclusão de Sandman, que envolve o reencontro com o irmão pródigo, Destruição, que abandonou seu reino e o contato com os demais Eternos.

Delírio é quem o convence da jornada, que não começa nada bem. Morpheus descobre que o enigma do paradeiro do irmão passa pelo filho Orfeu.

Sabemos no último episódio da primeira temporada que Calíope, a Musa da Literatura, e Morpheus são pais de Orfeu, e seu mito de ida ao Inferno em busca da amada Eurídice é recontado, assim como as consequências de seu ato.

O Rei dos Sonhos resgata o que resta do filho durante a Revolução Francesa, com a ajuda de Lady Constantine, vivida pela atriz Jenna Coleman, que já encarnou a personagem na temporada anterior, assim como a versão feminina de John Constantine.

É difícil para um fã das HQs avaliar a série sem pensar no original. De modo geral, a amenização do horror, como já disse, é passável para atrair um público maior, mas não sei se concordo com alguns cortes, como as consequências que o fechamento do Inferno causa no mundo dos vivos, sendo uma delas a origem da cancelada e promissora série Garotos Detetives Mortos.

Em todo caso, há belas cenas, como quinto e sexto episódios, sem falar que o elenco funciona. Agora é esperar que o Volume 2 seja satisfatório porque, até aqui, o desfecho tem sido.

 

por Marcos Kimura

Marcos Kimura é jornalista cultural há 25 anos, mas aficionado de filmes e quadrinhos há muito mais tempo. Foi programador do Cineclube Oscarito, em São Paulo, e técnico de Cinema e Histórias em Quadrinhos na Oficina Cultural Oswald de Andrade, da Secretaria de Estado da Cultura. Programa o Cineclube Indaiatuba, que funciona no Topázio Cinemas do Shopping Jaraguá duas vezes por mês.

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