Review | Matéria Escura (Apple TV+)

A Apple TV+ “esconde” diversas séries muito boas, além de produzir longas de prestígio como Napoleão e Assassinos da Lua das Flores. “Esconde” porque recebe pouca atenção da mídia em comparação à concorrência, e assim, produções de pano de fundo científico como Matéria Escura ou Constelação (a qual também devo um review) são muito menos badaladas do que, por exemplo, O Problema dos Três Corpos, da Netflix.

O título Matéria Escura se refere a um dos maiores mistérios da ciência, pois a maior parte da massa do universo não reflete a luz e, portanto, não pode ser visto, sem que ninguém saiba o que é. Seriam as infinitas realidades sugeridas pela física quântica, popularmente conhecida como multiverso?

Jason (Joel Edgerton, o Ramsés de Êxodo: Deuses e Reis) é um pacato professor de Física, casado com a marchand Daniela (Jennifer Connelly) e pai do adolescente Charlie (Oakes Fegley, de Meu Amigo, o Dragão).

Após a comemoração do prêmio acadêmico vencido pelo seu melhor amigo Ryan (Jimmi Simpson, o jovem Homem de Preto de Westworld), ele é sequestrado por um desconhecido e levado a uma realidade em que é um magnata da tecnologia, tendo como sócio o implacável Leighton Vance (Dayo Okeniyi, de Herói da Liberdade) e envolvido com a psicóloga Amanda (Alice Braga, orgulho da patriamada, salve, salve). Enquanto isso, um outro Jason assume seu lugar, especialmente como marido da bela Daniela.

Bom, após essa apresentação, é bom avisar que algum SPOILER rolará daqui para frente, embora eu tente evitar ao máximo.

A peça de tecnologia responsável pela viagem interdimensional é inspirada num das mais famosas ilustrações da Teoria da Incerteza, de Heisenberg: a caixa do gato de Shroëdinger.

O felino fechado dentro de uma caixa lacrada contra incoerência quântica induzida pelo ambiente, com um frasco de veneno que será quebrado por contador Geiger assim que detetar radiação, estaria ao mesmo tempo vivo e morto.

A física quântica acabou dando origem não só ao multiverso popularizado pela cultura pop, como a uma infinidade de picaretagens de autoajuda ou curas pseudocientíficas. Matéria Escura é um What If…? (série da Marvel originária dos quadrinhos) levado a sério: e se tivéssemos a oportunidade de ir a uma realidade em que optamos por outro caminho, ao invés do que estamos vivendo?

Obviamente, Jason 1 rapidamente chega à conclusão de Dorothy em O Mágico de Oz – não há nenhum lugar como o lar – e passa os nove episódios tentando voltar para lá. Para sorte dele, na companhia de Alice Braga.

Única pessoa brasileira – homem ou mulher – a protagonizar uma série americana (Rainha do Sul, para quem não sabe), Alice tem vários momentos icônicos, como o encontro com a mãe brasileira alternativa, com diálogo em português; e quando começa tocar Prince (Raspberry Beret), ela exclama “I love this song” e puxa Jason para a pista de dança (como não amar essa mulher?).

Na verdade, esse é para mim o grande problema da série, o protagonismo de Joel Edgerton, um habitual bom coadjuvante, mas a quem falta carisma para segurar o personagem. Alice e Jeniffer são muita areia pro caminhãozinho dele, esbanjando charme, beleza e atuação.

Sei que no mundo real isso também a acontece, mas numa série em que o herói tem que segurar nove episódios, não cola. Para maratonar, eu acho excessivo, mas para apreciar aos poucos, é ótima, ainda que a história fique meio arrastada durante a busca pela porta certa (vejam e entenderão), mas fará sentido no final, com uma solução criativa e inesperada para o fechamento da trama.

O roteiro deixa ganchos para uma continuação, que teria que ser muito engenhoso para continuar interessante e não o mais do mesmo.

Marcos Kimura http://www.nerdinterior.com.br

Marcos Kimura é jornalista cultural há 25 anos, mas aficionado de filmes e quadrinhos há muito mais tempo. Foi programador do Cineclube Oscarito, em São Paulo, e técnico de Cinema e Histórias em Quadrinhos na Oficina Cultural Oswald de Andrade, da Secretaria de Estado da Cultura.

Programa o Cineclube Indaiatuba, que funciona no Topázio Cinemas do Shopping Jaraguá duas vezes por mês.

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