Review: O Gabinete de Curiosidades de Guillermo Del Toro

Vencedor do Oscar de Direção e Filme com A Forma da Água (2017), além de assinar sucessos como Hellboy (o de 2004) e O Labirinto do Fauno (2006), Guillermo de Toro hoje pode se dar ao luxo de aparecer como apresentador de uma série de forma semelhante a Alfred Hitchcock nos anos 60.

Assim é O Gabinete de Curiosidades de Guillermo Del Toro, antologia com oito episódios lançada pela Netflix para o Halloween, cujas únicas coisas em comum são o terror e o aval do cineasta mexicano.

O primeiro, chamado Lote 36, é protagonizado por Tim Blake Nelson (série Watchmen, A Balada de Buster Scruggs) que faz  papel de um veterano de guerra reacionário, daqueles que escutam programas radiofônicos de extrema direita. Ele ganha a vida garimpando depósitos de aluguel abandonados pelos proprietários e se depara com uma oportunidade de negócios que pode resolver uma dívida urgente. Obviamente, nada é tão simples como parece, mas o plot todo parece meio forçado.

No segundo episódio – Ratos de Cemitério, em tradução livre – David Hewlett (O Beco do Pesadelo e A Forma da Água) é um coveiro que disputa com ratos o butim das sepulturas. Um morto muito rico que será enterrado com preciosidades vai atiçar ainda mais sua ganância. Marcelo Hessel, do Omelete, gostou, mas eu achei meio caótico, com excesso de informação não desenvolvida.

O terceiro, A Autópsia, é um dos melhores, com F. Murray Abraham (que stá na segunda temporada de White Lotus) como um médico-legista que é chamado por um velho amigo, xerife em uma pequena cidade, para desvendar um mistério envolvendo pessoas desaparecidas e uma explosão em uma mina. Dirigido e escrito por David Prior (O Mensageiro do Último Dia), merece ser visto com atenção.

O quarto episódio, Do Lado de Fora, é estrelado por Kate Menucci (mais conhecida como Lucy, uma das namoradas de Raj em The Big Bang Theory), que faz uma dona de casa esquisita adepta de taxidermia e acaba ficando obcecada por um creme vendido pela TV por um apresentador vivido por Dan Stevens (Legion e Downton Abbey), que promete mudar sua vida e aparência. Intenções melhores que a execução.

O quinto, O Modelo de Pickman, é um dos dois inspirados em H.P. Lovecraft. Ben Barnes (Sombra e Ossos e Westworld), em mais uma atuação canastrona, é um estudante de artes de família rica que cruza o caminho de um colega chamado Pickman (Crispin Glover, de De Volta para o Futuro e As Panteras, outro adepto do overacting), que pinta quadros grotescos que afetam a mente de quem os vê. O horror indescritível – que o próprio escritor se omite de detalhar – é tipicamente lovecrafitiano, o que não significa ser bom.

O sexto, Sonho na Casa da Bruxa, é outro baseado em Lovecraft, e é estrelado por Rupert Grint (o eterno Ron Weasley, bestie de Harry Potter), que interpreta um jovem marcado pela morte da irmã gêmea e a subsequente visão dela sendo carregada para um além-vida. É dirigido por Catherine Hardwick, que assinou o primeiro filme da saga Crepúsculo, o que resume tudo.

No sétimo, A Inspeção, um milionário (Peter Weller, o primeiro e único Robocop) convida um escritor famoso, um paranormal, um produtor musical de sucesso e uma astrofísica para inspecionar uma aquisição misteriosa. O que é mais interessante neste trabalho de Panos Cosmatos (Mandy: Sede de Vingança) é a ambientação na virada dos anos 70 para os 80, tanto nos personagens, estilo e vícios, quanto nos efeitos que remetem a Caçadores da Arca Perdida, Poltergeist e A Fúria.

O oitavo e último episódio, O Murmurinho, é, de longe, o melhor. Um casal de ornitólogos (Essie Davis, da série Os Mistérios de Miss Fischer, e Andrew Lincoln, o Rick Grimes de The Waling Dead) se muda temporariamente para uma casa isolada numa ilha para observar de perto o comportamento de uma espécie de ave, um ano depois de viver uma tragédia. Mas a própria residência guarda seu próprio segredo. Poderia ser mais uma história de casa assombrada, mas a direção de Jennifer Kent (The Nightingale) e a atuação de Essie Davis fazem uma história escrita pelo próprio Guillermo Del Toro numa pequena obra-prima.

Não há notícias de uma segunda temporada por enquanto – mesmo o sucesso Sandman demorou meses para confirmar uma continuação – mas, apesar dos baixos, os altos desta produção justificam uma sequência.

Marcos Kimura http://www.nerdinterior.com.br

Marcos Kimura é jornalista cultural há 25 anos, mas aficionado de filmes e quadrinhos há muito mais tempo. Foi programador do Cineclube Oscarito, em São Paulo, e técnico de Cinema e Histórias em Quadrinhos na Oficina Cultural Oswald de Andrade, da Secretaria de Estado da Cultura.

Programa o Cineclube Indaiatuba, que funciona no Topázio Cinemas do Shopping Jaraguá duas vezes por mês.

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