Após Estou Pensando em Acabar Com Tudo, drama que não facilita em nada a vida do espectador, a Netflix chega com mais uma obra espinhosa em 2020 – aquela que promete ser a temporada mais prolífica para o serviço de streaming nas premiações que estão por vir.
Durante sua ainda curta carreira cinematográfica, o diretor Antonio Campos vem lidando com assuntos delicados, seja a depressão (Christine, de 2016) ou as drogas (Depois da Escola, de 2008), passando até pelos filmes de gênero em um intrigante thriller psicológico em seu segmento na coletânea Feito em Casa (Homemade), também lançada pela Netflix este ano.
Chegando no serviço de streaming amanhã, 16 de setembro, O Diabo de Cada Dia é um filme desesperançoso, onde Campos segue com rigor seu estilo nada otimista de contar suas histórias.
Baseado no romance de Donald Ray Pollock, Campos toca na ferida com um filme repleto de violência e uma potente discussão acerca dos malefícios dos excessos da fé, evidenciando as corrupções diárias de pessoas que fazem do mundo um lugar tão doentio.
De cara, o elenco chama a atenção: do fiel pai de família de Bill Skarsgård ao pastor profano de Robert Pattinson, do casal perverso vivido por Jason Clarke e Riley Keough, ao xerife corrupto de Sebastian Stan. Neste mosaico coberto por um cenário pós-guerra, os moradores de Knockemstiff têm suas vidas entrelaçadas de forma bem sinistra.
E com um elenco tão estelar, é prazeroso notar como Campos sabe utilizá-los de forma crucial na narrativa, mesmo que pareça abandonar alguns deles.
Mensagem
Ora, quando lemos a Bíblia sabemos que Adão e Eva não irão nos acompanhar até o final, e é o mesmo que acontece aqui: quem aparece em tela nos traz uma mensagem clara e evidente.
E não faço essa alusão à Bíblia por acaso, aqui, observamos tudo aos olhos e voz do narrador (uma espécie de Deus: onisciente e onipresente) e, dentre tantos personagens, falhos, corruptos, vítimas, inocentes e justos, não há ninguém desperdiçado, ainda que alguns tenham mais destaque do que outros.
Assim, reside justamente no personagem de Tom Holland, o jovem Arvin Russell, a bússola moral de O Diabo de Cada Dia. Os personagens ao seu redor são tão cheios de imoralidade e crueldade que podemos traçar um paralelo entre Arvin e o Jó da Bíblia.
Jó era rico, paciente e temente a Deus. Vendo aquilo, o diabo confronta Deus dizendo que Jó só é temente a ele porque tem saúde, propriedades e riquezas, e faz um aviso: tirarei tudo dele para provar que sua fé é falível.
Deus concorda, e o diabo foi tirando tudo de Jó: seus animais, sua família, seus bens e sua saúde. Mesmo assim, Jó se manteve fiel a Deus, aceitando tudo: “se aceitamos os bens de Deus, por que não aceitar também os seus males?”.
Meio que sem querer, Arvin sofre com este diabo de cada dia e segue nessa via crucis como um rito de passagem. A devoção cega de seu pai, de alguma forma, reflete em sua trajetória árdua e sofrida. Calejado, mesmo tão jovem, ele abre os olhos quando mais precisa deles para sobreviver.
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Confira o trailer de O Diabo de Cada Dia:
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