Review | História de um Casamento

Talvez o amor seja o sentimento mais difícil de se definir em palavras, embora o longa se inicie com os protagonistas lendo cartas elogiosas sobre o outro em uma terapia de casal, que poderiam servir como provas de amor – se é que elas existem. A simplicidade dos momentos, qualidades e atitudes descritas por eles emanam o amor. É pena que Nicole e Charlie não enxerguem mais tal beleza.

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Para Nicole (Scarlett Johansson) e seu marido Charlie (Adam Driver) o amor já não é mais uma árvore que dá frutos. O casamento de mais de dez anos parece ser algo que ambos têm a obrigação de regar a cada dia, sem o mesmo entusiasmo de outrora. Ela quer o divórcio e ele se espanta com a notícia. Charlie é um diretor de teatro que trabalha em Nova York, se dedicando demais ao trabalho e cada vez menos à família.

Nicole é uma atriz promissora que decide ir morar com a mãe e o filho Henry em Los Angeles, cidade na qual o casal se conheceu, onde está envolvida com o piloto de uma série de TV. Separados por um país inteiro e sem entrarem em comum acordo, o processo de separação se torna ainda mais doloroso quando ambos envolvem advogados que querem vitória e dinheiro.

Consolidação

Noah Baumbach vem se consolidando como um dos diretores e roteiristas mais maduros do cenário indie norte-americano. Desde A Lula e a Baleia – pelo qual fora indicado ao Oscar de Melhor Roteiro Original -, suas terapias familiares são tão reais, dolorosas, engraçadas e genuínas. É perceptível sua disposição em expor as motivações e sentimentos de seus personagens. Aqui, Adam Driver e Scarlett Johansson, libertos de quaisquer estereótipos, comandam o show em seus números verborrágicos, explosivos, expressivos e emocionados, elevando o filme em intensidade a cada momento, juntos ou separados.

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História de um Casamento é inspirado no relacionamento de Baumbach com a atriz Jennifer Jason Leigh, por isso, a visão masculina assume um viés protagonista. O trunfo do roteiro de Baumbach é ser sensível a ponto de nos permitir olhar também para o íntimo de Nicole, potencializado por uma Johansson no auge da carreira e digna de prêmios: emotiva e impotente, indo facilmente da confissão tímida ao choro copioso, necessitando de uma advogada brutal como a Nora de Laura Dern – que também deve surgir com força na temporada de premiações – para lutar por aquilo que lhe fora negligenciado em anos de casamento.

Esta dualidade entre os protagonistas se reflete também nos advogados contratados pelas partes. A princípio, Charlie renega o caríssimo e ofensivo Jay (Ray Liotta) para ser representado por um solidário e confuso Bert (Alan Alda, já em grau avançado da doença de Parkinson), o que acaba sendo um ótimo contraponto para o egoísmo e egocentrismo que o impossibilitou de enxergar os esforços e abdicações que a esposa Nicole fizera em prol de sua carreira, enquanto a dela ficava fadada ao ostracismo imposto por um machismo velado que o roteiro de Baumbach explora com certa sutileza.

Chegando ao ápice de sua carreira, Baumbach traz também o velho conflito de ideias que costumeiramente explora em sua filmografia – os pais e filhos de Os Meyerowitz, o conflito geracional de Enquanto Somos Jovens -, aqui materializado pelo distanciamento entre as cidades de Los Angeles e Nova York, sempre com bom humor.

História de um Casamento estreia dia 6 de dezembro na Netflix

Confira o trailer abaixo:

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Angelo Cordeiro

Paulistano do bairro de Interlagos e fanático por Fórmula 1. Cinéfilo com obsessão por listas e tops, já viram Alta Fidelidade? Exatamente, estilo Rob Gordon. Tem três cães: Johnny, Dee Dee e Joey, qualquer semelhança com os Ramones não é mera coincidência, afinal é amante do bom e velho rock'n'roll. Adora viajar, mas nunca viaja. Adora futebol, mas não joga. Adora Scarlett Johansson, mas ainda não se conhecem. Ainda.

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