Review | A Mula

Sem querer agourar ninguém, mas Clint Eastwood vai deixar saudades quando se for. Um cineasta beirando os 90 anos e que ainda segue em atividade, atuando e dirigindo, é coisa rara de se ver na história do cinema, e num nível elevado de direção como Eastwood tem feito nos últimos 5 anos – vamos esquecer 15h17 – Trem para Paris, ok? – é mais raro ainda.

Em A Mula, Eastwood volta a dirigir e protagonizar um longa, coisa que não acontecia desde 2008, com Gran Torino. De lá pra cá, Eastwood dirigiu alguns atores de ponta como Matt Damon e Morgan Freeman em Invictus (2008), Leonardo DiCaprio em J. Edgar (2011), Bradley Cooper em Sniper Americano (2014) e Tom Hanks em Sully: O Herói do Rio Hudson (2016), mas há um charme especial quando vemos esse velho boa praça conduzindo as jornadas de seus heróis na frente e atrás das câmeras.

Com um roteiro assinado por Nick Schenk (Gran Torino) e Dave Holstein, baseado no artigo da New York Times MagazineThe Sinaloa Cartel’s 90-Year-Old Drug Mule”, de Sam Dolnick, A Mula conta a história de Earl Stone (Eastwood), um senhor nonagenário que, após perder tudo o que tinha, aceita um trabalho misterioso onde deveria apenas dirigir. Sem saber que estava servindo como mula para um cartel de drogas, Earl se torna uma lenda no ramo, porém a fama o deixa no radar do DEA e do agente Colin Bates (Bradley Cooper).

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Earl Stone é um idoso que se vê fora de contexto – e de saco cheio – num mundo informatizado, a todo instante ele reclama da internet – como na abertura que serve de prefácio para seus dramas familiares – e dos celulares que não saem das mãos da nova geração. Com isso, a dificuldade ao ter que enviar mensagens de texto nos celulares descartáveis que recebe em seus trabalhos acaba virando uma piada que vai evoluindo e nunca fica repetitiva.

Além de se ver deslocado num mundo contemporâneo e moderno onde “sapatas” dirigem motocicletas, Earl é praticamente uma persona non grata nas reuniões familiares. Para ele, o trabalho como horticultor sempre esteve à frente de tudo e, apesar de não demonstrar que carrega o fardo e o remorso de sua ausência em datas importantes para os entes queridos, é justamente neste trabalho arriscado que Earl encontra uma maneira fácil de conseguir dinheiro e se aproximar daqueles que ele relegou por tantos anos.

É quando aborda o drama de Earl com a esposa Mary (Dianne Wiest de Hannah e Suas Irmãs) e a filha Iris (Alison Eastwood, também filha de Clint na vida real) que o longa ganha força, já que a parte do thriller se destaca não por cenas de ação com ótimas perseguições, mas por tiradas cômicas hilárias que tornam a sessão bastante agradável e dão refresco aos diálogos repletos de carga emocional e à trilha sonora – que não é de Eastwood – sentimental.

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As pontas dos coadjuvantes não chegam a roubar a cena, apenas Andy García (Passageiros) – que parece ter nascido para ser coadjuvante de luxo – é capaz de nos tirar aplausos. Já Cooper, Wiest, Laurence Fishburne (John Wick: Um Novo Dia Para Matar), Michael Peña (Homem-Formiga e a Vespa) e Taissa Farmiga (A Freira) cumprem seus papéis sem merecer grande destaque.

Acaba que o filme é mesmo do senhor Clint Eastwood, ainda capaz de ser extremamente expressivo – note as mudanças das expressões de seu rosto entre os primeiros trabalhos e os sequentes – e que ele continue assim por longa data, é sempre bom vê-lo em ação fazendo cinema comercial com o coração.

Mesmo que A Mula desperte a curiosidade do espectador para saber como um senhor de 90 anos se virou para desenrolar com traficantes mexicanos perigosos e se livrar de policiais do DEA, aqui o que fala mais alto é o drama do homem que levou tempo demais para perceber o tempo que havia perdido.

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