Review | Desapega!

Após dirigir o filme Me Tira da Mira (2022), com Fábio Junior e sua filha Cléo Pires, Hsu Chien (lê-se Chu Chem) completa o bingo dessa ex-família de artistas, trabalhando agora com a mãe Glória Pires, que não só protagoniza, mas também colabora com o roteiro da comédia Desapega!, que estreia essa semana nos cinemas.

A história gira em torno da designer de interiores Rita (Glória Pires), uma viúva que, ao tentar suprir a perda do marido, fazendo compras, acaba se excedendo a ponto de se tornar uma dependente disso.

Após algum tempo, parecendo ter superado o vício, ela chega a engatar um romance com o divertido e paranoico contador Otávio (Marcos Pasquim) e até mesmo a liderar um grupo de apoio a compradores compulsivos que buscam por autocontrole. Porém, quando sua filha Duda (Maísa, ex Bom Dia & Cia) resolve se programar para um intercâmbio, toda essa superação é posta à prova.

O APEGO POSITIVO

Colecionador de filmes em mídias físicas, o diretor assume emprestar esse seu lado aficionado por novas aquisições retratado nas personagens do filme, que vão do jovem Rômulo (Wagner Santisteban, o Basílio da série Sandy & Junior) à veterana Gisélia (Malu Valle, a Shirley da novela Senhora do Destino).

Esse, aliás, é um aspecto positivo do filme: a cômica e trágica falta de perseverança do grupo de viciados em compras e os conflitos no trabalho de Otávio. Ambos os núcleos dividem o tempo de tela de forma equilibrada e se mostram entrosados com os atores principais.

Apesar dos preparos para as filmagens terem sido feitos por videochamadas, durante o início da pandemia de Covid-19, nota-se que houve uma integração saudável entre todos, conforme contou Marcos Pasquim em coletiva de imprensa que o Nerd Interior marcou presença.

O DESAPEGO NEGATIVO

A produção tem um bom tom cartunesco, tanto em atuações caricatas, quanto em efeitos visuais, como quando Rita inala um perfume em promoção e o mundo ao redor perde importância. No entanto, parece haver um receio da equipe técnica em abraçar de vez o clima de comédia pastelão e/ou desenho animado, oscilando tais momentos com trechos levados muito a sério em diálogos que buscam mais um realismo e escorregam num drama bastante raso.

Talvez uma fotografia com enquadramentos inusitados e movimentações de câmera mais ousadas, além de uma edição mais dinâmica, com cortes mais rápidos, dessem o polimento final que o filme precisa. Isso sem contar que, com mais tomadas de cada plano, há mais opções de registros de sucesso de atuações mais fluidas.

Infelizmente, o diretor optou por poucas tomadas, como bem revelou Maísa em coletiva de imprensa. Desse modo, o resultado final acabou sendo nitidamente prejudicado.

Outra ironia é um filme que critica e tira sarro de consumismo exacerbado fazer propagandas a todo instante. Soa forçado, vulgar e nada coerente com a proposta do roteiro e nem com a publicidade digna das marcas extremamente expostas.

Bons tempos os da sutileza, quando um mero objeto cenográfico ao fundo era duma marca famosa! Agora, praticamente o filme pausa para “dar aquele recadinho especial dos patrocinadores” de programas duvidosos de tardes entediantes.

O SALDO OTIMISTA

Ainda assim, ver um tema sério de compulsão ser tratado com bom humor e leveza, é uma boa alternativa para a audiência, que pode refletir bastante sobre o desapego de bens supérfluos e hábitos ruins, além de se divertir com as graças do filme.

Bruno Tiozo http://www.nerdinterior.com.br

Designer e acadêmico do Instituto de Artes de Campinas, propõe reflexão crítica no apreço às expressões poéticas das artes audiovisuais. Foca no Cinema ficcional, cujos filmes em mídias físicas coleciona como souvenir de universos visitados, de modo que as memórias na estante sirvam para inspirações constantes.

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