Pela primeira vez, duas mulheres concorrem ao Oscar de Melhor Direção no mesmo ano, e por filmes considerados favoritos. Uma delas é a chinesa radicada nos EUA, Chloé Zhao, por seu belo Nomadland.
Frances McDormand é candidata a um terceiro prêmio de Atriz da Academia (já ganhou por Fargo e Três Anúncios para um Crime) pelo papel de Fern, uma viúva sem filhos que perdeu o emprego, a casa e decidiu se tornar nômade, percorrendo o país seguindo empregos sazonais em meio a paisagens naturais e ruínas do capitalismo.
Em sua jornada, ela conhece diversas pessoas com vidas semelhantes, que tentam sobreviver ao fim do wellfare state e à precarização do trabalho.
Quase todos os que aparecem no filme são amadores (a exceção mais notável, além de Frances, é David Strathairn, de Boa Noite e Boa Sorte), que usam o próprio nome, falando de suas vidas – o que lembra Amor Sem Escalas, em que pessoas que haviam perdido o emprego na crise de 2008 davam seus depoimentos como parte da narrativa. E como outro grande filme de depressão econômica, Vinhas da Ira, os personagens deixam seus lares perdidos em seus velhos automóveis – único bem restante – buscando trabalho e sustento.
A diferença aqui é que não se trata de um debacle financeiro pontual: é o fim do American Way of Life e do mito da Terra das Oportunidades. Os empregos exportados não retornarão, assim como as aposentadorias dignas e a capacidade de arcar com um plano de saúde. As casas não são mais um lar, mas uma dívida impagável.
Fim de um império
A diretora retrata o processo com o fascínio de um historiador testemunhando o fim de um império, mas também com o afeto que um autor dedica a um personagem de sua criação. Não há a esperança de dias melhores do clássico de John Ford, nem o cinismo do protagonista de George Clooney no filme de Jason Reitman: Fern apenas segue sua vida na van, recusando novas raízes e laços permanentes.
Chloé assume uma autoria às antigas, assinando não apenas direção, roteiro (adaptado do livro de Jessica Bruder), mas também a montagem, o que é muito mais raro – e com todas essas funções indicadas ao Oscar. As escolhas da fotografia de Joshua James Richards (que é um parceiro habitual, também indicado) e a música incidental de Ludovico Einaldi (Intocáveis) são impecáveis, sublinhando a melancolia da protagonista.
Mesmo não ambientado na atual pandemia, Nomadland é um filme que reflete o estado de espírito atual, pelo distanciamento em que os personagens se encontram e o desencanto com que vivem a América. É favoritaço ao Oscar de Filme, Direção e Roteiro Adaptado.
Vale MUITO a pena assistir.
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