Review | Relatos do Mundo (Netflix)

Todo e qualquer conflito deixa cicatrizes. Mas, ao final, a pergunta é sempre a mesma: o que fazer agora? Em Relatos do Mundo, disponível na Netflix, o astro Tom Hanks (Náufrago) e o diretor Paul Greengrass (Voo United 93 e Zona Verde) se unem novamente, após Capitão Phillips, para adaptar o livro de Paulette Jiles, lançado em 2016, e contar uma improvável história de amizade no Oeste americano pós-Guerra Civil.

Previsto para estrear nos cinemas brasileiros em 2020, a produção chega diretamente ao serviço de streaming e já é forte candidato a indicações ao Oscar – ainda mais após as indicações de Helena Zengel para Melhor Atriz Coadjuvante e de James Newton Howard para Melhor Trilha Sonora Original no 78º Globo de Ouro.

Porém, antes de falar sobre o filme, vamos à sinopse:

Cinco anos depois da Guerra Civil, o capitão Jefferson Kyle Kidd (Hanks), veterano de três guerras, agora viaja de cidade em cidade para contar histórias reais, compartilhando notícias sobre presidentes e rainhas, grandes disputas, catástrofes devastadoras e aventuras emocionantes nos cantos mais distantes do planeta.

Nas planícies do Texas, ele conhece Johanna (Zengel, de Transtorno Explosivo), uma garota de 10 anos de idade que foi adotada pelo povo Kiowa há seis anos e criada como um deles. Hostil a um mundo que nem chegou a conhecer, agora Johanna está sendo devolvida aos tios biológicos contra sua vontade.

Kidd concorda em levar a criança até seus tutores legais. Durante a viagem de centenas de quilômetros pelo deserto implacável, os dois enfrentam grandes desafios humanos e naturais enquanto procuram um lar para chamar de seu.

Estreia

Antes de tudo, uma curiosidade: apesar de seu extenso currículo, este é o primeiro faroeste da carreira de Tom Hanks. Greengrass, que dirige e coescreve o roteiro com Luke Davies (Lion – Uma Jornada para Casa) fala sobre a escolha do projeto. “Relatos do Mundo se passa em 1870, mas é um filme sobre nossos tempos”, afirma. “Vizinhos, famílias e comunidades estavam em um forte e violento conflito entre si, e os americanos precisavam decidir quem eram os americanos”.

Neste cenário, o romance escrito por Paulette Jiles, indicado ao National Book Award, revela um Texas moralmente complexo na caótica era pós-Guerra Civil, e a figura de Kidd, que viaja entre comunidades lendo notícias locais, nacionais e internacionais, ganha importância. “Quando o tecido da sociedade está em frangalhos, você tem este personagem solitário que, de forma singular, é um fio que conecta uma comunidade a outra”, afirma Greengrass.

Paul Greengrass nas filmagens de ‘Relatos do Mundo’, primeiro faroeste da carreira de Tom Hanks

Hanks concorda. “Fiquei fascinado com este ofício. Ao ler as notícias, Kidd proporciona uma noite de entretenimento e momentos de iluminação para as pessoas que estavam abertas para o que estava acontecendo no mundo”. Contudo, além de prover seu sustento, tal ofício também serve para mantê-lo longe de casa.

Antes da guerra, Kidd era um tipógrafo, obrigado a abandonar a esposa, sua gráfica e a paixão pelas letras, para lutar em uma guerra que não era sua. Porém, esta solidão se transforma quando conhece Johanna, interpretada magistralmente por Helena Zengel. Mesmo que sua personagem não saiba uma palavra em inglês, a atriz consegue passar ao espectador toda sua tristeza, raiva, dúvida e medo, enquanto tenta descobrir mais sobre o homem que resolve ajudá-la.

Embora estejam separados por décadas de idade, experiência de vida e linguagem, ambos sofreram muitas perdas e agora se encontram sem teto. “Estes personagens estão perdidos por razões muito diferentes”, afirma Greengrass. “E essa jornada em que embarcam é realmente um caminho para a cura”.

Improvável

Ambientando no velho Oeste americano, Relatos do Mundo é um faroeste, digamos assim, pouco convencional. Os tiroteios estão representados, mas o foco mesmo é revelar como os Estados não eram tão Unidos assim. Neste cenário de incertezas e muita revolta com as principais forças políticas, como o presidente Ulysses S. Grant, a improvável história de amizade entre Kidd e Johanna merece sua atenção.

De um lado, o capitão quer deixar a guerra para trás e esconde um segredo que não o permite voltar para casa. Assim, resolve viver na estrada, levando notícias e conhecimento a uma sociedade ainda pouco desenvolvida. Quando seu caminho cruza com o de Johanna, Kidd descobre um novo objetivo na vida, sem ter ideia de onde aquilo o levará.

Aos poucos, uma relação paternal surge em meio a muitas incertezas, perdas e traumas. A falta de perspectiva vai ganhando novos contornos na perigosa viagem que a dupla faz até Castroville, onde Kidd deixará Johanna aos cuidados de seus parentes. O final nem se discute, o que vale é a jornada.

Some esta bela história a figurinos e cenografias caprichadas, a uma trilha sonora que ecoa Ennio Morricone e a bela fotografia de Dariusz Wolski (Perdido em Marte). Relatos do Mundo pode não levar muitos prêmios, mas com certeza se fará presente com várias indicações.

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