Review | Corso (Editora Comix Zone)

O ano de 2012 ficou marcado no mundo dos quadrinhos nacionais pelo lançamento do projeto Graphic MSP. Voltada para o público adulto e juvenil, o selo da Mauricio de Souza Produções visava a publicação de histórias maduras.

Astronauta: Magnetar, o título de estreia do projeto, de cara arrebatou o meu coração. O primeiro volume de Astronauta é o casamento perfeito de duas das minhas grandes paixões: ficção científica e a Turma da Mônica. Porém, esse casamento só é um sucesso graças ao artista que dá vida ao quadrinho, Danilo Beyruth.

Magnetar foi o meu primeiro contato com Danilo, mas estava longe de ser o último. Em pouco tempo, conheci outras de suas obras como Samurai Shirô e Love Kills, além das sequências de Astronauta.

A cada lançamento, é notável como Beyruth se desafia na missão de entregar algo novo de si para suas histórias. E isso não é diferente com Corso, seu mais novo quadrinho publicado pela Comix Zone.

Voltando ao gênero da ficção científica, o autor nos presenteia com uma grande aventura protagonizada por animais antropomórficos. Nesse mundo, tomado por guerras espaciais, somos apresentados ao protagonista que dá título ao quadrinho.

Corso, um dos melhores pilotos da República dos Cães, é conhecido dentro da tropa por sua insubordinação e temperamento forte. Durante uma patrulha, o jovem piloto se depara com uma nave da Monarquia dos Gatos, inimiga mortal de seu povo.

O conflito resulta na queda do cão em um planeta completamente desconhecido. Com seu veículo destruído e sem comunicação com a tropa, o pequeno cachorro inicia uma jornada pela sobrevivência.

Em seu caminho, Corso encontrará um mundo estranho, povoado por criaturas perigosas e uma misteriosa tribo de nativos guerreiros. Cabe ao jovem piloto vencer todos os desafios desse planeta na esperança de um dia poder voltar ao seu lar.

Danilo é mestre em escrever boas histórias de ação e aventura. É impossível não se envolver e se divertir com as situações criadas no roteiro e o leitor se vê rapidamente preso ao quadrinho após algumas páginas. O texto flerta em vários momentos com grandes clichês, mas em momento algum vemos saídas fáceis na narrativa.

A rivalidade de cães e gatos, por exemplo, passa longe da simples dualidade do bem versus mal. O roteiro é hábil em pegar o leitor de surpresa com boas reviravoltas.

O desenvolvimento de Corso, como personagem, também é digno de nota. Desde a primeira página, temos o vislumbre do bom soldado que o cão é. O jovem piloto é resiliente, determinado e muito cabeça dura. Porém, no decorrer da jornada, conhecemos o seu lado doce e companheiro.

O uso de flashbacks pontuais na história ajuda na compreensão de seu passado e do seu temperamento difícil. Corso, durante toda aventura, tem suas crenças testadas, forçando o jovem a refletir sobre suas verdades. Ao fim da jornada, temos uma bela evolução do personagem principal.

Infelizmente, o bom desenvolvimento fica restrito ao protagonista. Como Corso é o grande destaque da obra, acaba sobrando pouco espaço para outros personagens. Os coadjuvantes são bons, porém as suas histórias e motivações são apresentadas de forma mais apressada.

É compreensível a escolha do autor em manter as histórias paralelas no subtexto. De outra forma, teríamos uma narrativa maior e muito mais densa, o que acredito não ser a intenção da obra. Contudo, não posso negar que me faz falta ver um pouco mais de alguns personagens, principalmente dos mais recorrentes.

Porém, isso pode ser apenas minha vontade de ver mais da história. Aliás, Danilo é hábil em te deixar com o gostinho de quero mais na boca.

Agora, se o roteiro tem seus muitos altos e pouquíssimos baixos, o mesmo não pode ser dito da arte. Beyruth é um desenhista de mão cheia! Inspirado pelos quadrinhos da Disney, o artista cria personagens animalescos que navegam facilmente da fofura ao ameaçador.

É fácil se perder na beleza deles em momentos mais reflexivos, ou gargalhar com suas caretas em momentos mais cômicos. Porém, na hora da ação, não é difícil de comprar o quão esses personagens são fortes e extremamente perigosos.

Outro ponto que salta aos olhos em relação aos desenhos é o design do planeta. O quadrinho nos presenteia com belíssimas paisagens e criaturas incríveis. O desenhista cria uma fauna rica, que funciona de forma curiosa, obedecendo suas próprias leis da física e biologia.

Deixo um destaque para a pequena criatura que se torna a melhor amiga de Corso durante sua jornada. O animalzinho, que lembra uma borboleta, ganha o nosso coração desde sua primeira aparição, sem soltar uma única palavra.

Beyruth também é um expert da narrativa gráfica. Alguns dos seus quadros são inspiradores e parecem ter saído das telas do cinema. Suas escolhas de ângulos e quadros são precisas para contar mais dos cenários ou sobre os sentimentos dos personagens. E é na ação que vemos o desenhista brilhar.

A cenas são frenéticas e muito bem coreografadas. O bom uso das linhas de movimento que temos aqui contribuem para aumentar a sensação de agilidade dos personagens. Essas linhas, somada a escolha certeira de quadros e cortes, criam cenas de ação sensacionais.

Em relação ao projeto gráfico, temos uma linda e enxuta edição da Comix Zone. A capa colorida com verniz localizado está maravilhosa, assim como as guardas do quadrinho. Nos extras temos um texto de introdução de Sidney Gusman e uma biografia do artista.

E, para os felizardos que compraram na pré-venda, o quadrinho veio ainda acompanhado de um belíssimo bookplate autografado pelo autor.

Corso é uma ótima aventura! Caminhando ao lado do cãozinho marrento, testemunharemos boas cenas de ação e muita diversão. Porém, o quadrinho se propõe a ir um pouco mais além. A ternura também está presente nessa história, que nos leva ao encontro de uma importante lição.

Nessa obra, Danilo tinha a possibilidade de requentar velhos conceitos e criar uma história genérica. Porém, mais uma vez o artista se desafia e entrega algo diferente de todas as suas obras anteriores. Assim, Beyruth brilha novamente e mostra o porque ele é, sem dúvida nenhuma, um dos maiores quadrinistas nacionais da atualidade.

Corso tem 232 páginas em preto e branco. Capa dura e formato 26,5 x 17,5 cm. Lançamento: Janeiro/2022

 

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