Review | O Tigre Branco (Netflix)

Apontado por alguns como o Parasita indiano, O Tigre Branco é, na verdade, a resposta indiana ao exploitation sociocultural que foi Quem quer Ser um Milionário? O protagonista Balram (Ardash Gourav) cita diretamente o filme vencedor de oito Oscar quando afirma que está preso num galinheiro e “não acredite por um segundo que há um game show de um milhão de rúpias que você pode ganhar para escapar dele”.

Para este belo filme escrito e dirigido por Ramin Bahrani (do remake de Fahrenheit 451), baseado no romance de Aravindi Adiga, não há saída fácil da miséria na maior democracia do mundo. Estrelado e produzido pela estrela indiana radicada em Hollywood, Pryanka Chopra Jones, O Tigre Branco foi anunciado pela própria no último dia 15 como indicado ao Oscar de Roteiro Adaptado, um dos principais da Academia.

A história já nos apresenta nosso herói como um bem-sucedido empresário da região de Bangalore, o Vale do Silício Indiano, que por meio de um e-mail endereçado ao primeiro-ministro chinês, que visitará a Índia, vai contar sua história de sucesso.

Saído dos rincões miseráveis do imenso subcontinente, ele mostra uma sociedade em que um sistema de poder similar ao nosso coronelismo domina as comunidades sufocadas pela tradição das castas que sustentam o imobilismo social.

A ambição de Balram é inicialmente apenas sair daquele lugar miserável e sem futuro. Ele usa sua lábia para convencer a avó usurária a lhe pagar uma autoescola para se tornar motorista da família do cappo local.

A cada etapa galgada ele se acha esperto, mas aos poucos percebe que tudo é uma ilusão, e que por qualquer capricho dos patrões pode perder seu emprego mixuruca e cair na miséria absoluta. A princípio, isso faz com que ele se agarre ainda mais a seus mestres.

Fábula

Aqui temos a participação da estrela Pryanka Chopra Jones – que já protagonizou um seriado americano (Quantico) – no papel de Pinky, esposa do filho caçula do chefão, Ashok (Rajkummar Rao). Como uma jovem mulher criada nos EUA, ela dá a Balram o vislumbre de que o modo como é tratado não é a única forma de relação de trabalho possível. Também é ela a responsável pelo evento transformador na vida do protagonista.

O filme é uma fabula sobre o capitalismo, política (a figura caricata da Grande Socialista, que cobra propina para permitir a sonegação, deve fazer sorrir os fãs da Lava Jato) e desigualdade social. O humor torna mais palatável um retrato devastador de um país que em muito se parece com o nosso, com vantagens (é de lá que vem boa parte das nossas vacinas) e desvantagens (aqui ainda há direitos trabalhistas).

Mas, principalmente, torna ainda mais patética a visão edulcorada e desonesta de Danny Boyle em seu filme de 2007, não por coincidência, o mesmo ano em que a maior parte da ação de O Tigre Branco acontece.

Recomendo!

 

Marcos Kimura http://www.nerdinterior.com.br

Marcos Kimura é jornalista cultural há 25 anos, mas aficionado de filmes e quadrinhos há muito mais tempo. Foi programador do Cineclube Oscarito, em São Paulo, e técnico de Cinema e Histórias em Quadrinhos na Oficina Cultural Oswald de Andrade, da Secretaria de Estado da Cultura.

Programa o Cineclube Indaiatuba, que funciona no Topázio Cinemas do Shopping Jaraguá duas vezes por mês.

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