Poucos produtos audiovisuais – filmes e séries – me agradaram tanto ultimamente quanto A Diplomata, da Netflix, lançada já há algum tempo e com a segunda temporada já garantida. Um dos motivos é que o roteiro trata a política de forma realista e não a visão demonizada de seriados como House of Cards, com que foi comparada por algum crítico.
O tratamento é mais próximo de West Wing (1999-2006), o melhor produto audiovisual sobre a política americana já feito, e aí fico sabendo que a showrunner Deborah Cahn trabalhou na série de Aaron Sorkin como roteirista e produtora. Não é para menos, então.
Keri Russell, que surgiu para o mundo do entretenimento como Felicity (no Brasil, apelidada maldosamente de Tristicity) mas se consolidou como atriz protagonista em The Americans, é a força motriz da série, lhe rendendo mais uma indicação para o Emmy.
Ela é Kate Wyler, uma diplomata mais afeita aos bastidores e às negociações secretas envolvendo reféns e fuga de pessoas que lutam contra regimes totalitários, enquanto o marido Hal (Rufus Swell, muito bem também) gosta de ser o herói do momento, mesmo sem considerar as consequências, como cair em desgraça com o secretário de Estado Ganon (Miguel Sandoval, da série Medium).
Por uma dessas reviravoltas da política, ela é alçada ao cargo de embaixadora na Inglaterra, após um atentado contra um porta-aviões britânico no Oriente Médio. Ela assume a tarefa a contragosto, sem saber que é um teste para que ela alcance uma posição ainda mais importante.
Clandestinas
Acostumada a missões quase clandestinas no mundo árabe, Kate tem que se acostumar com a etiqueta britânica e às negociações em meio a eventos elegantes a bordo de vestidos de grife.
Ao mesmo tempo, tenta desvendar a dinâmica da diplomacia do premier Trowbridge (Rory Kinnear, que também interpretou um primeiro-ministro no primeiro episódio de Black Mirror, embora eu o prefira como o trágico monstro de Frankenstein de Penny Dredful) e constrói uma relação de confiança com o chanceler Dennison (David Gyasi, de Aniquilação).
Enquanto isso, na embaixada, seu principal assessor, Stuart Heyford (Ato Essandoh, de Elementary), ao mesmo tempo que namora a agente da CIA residente, Eidra Park (Ali Ahn, de Histórias de Amor), acaba sabendo mais sobre a perspectiva de carreira da sua chefe que a própria.
Curiosamente, uma das assessoras da embaixada é interpretada por Georgie Henley, a Lucy de Crônicas de Nárnia, caso você ache seu rosto familiar.
Como em West Wing, fatos da vida real acabam surgindo na trama de forma disfarçada, como a vice-presidente afrodescendente que era cotada para concorrer à eleição no lugar do idoso presidente, mas que acabou escanteada e prestes a perder o posto (Kamala Herris foi para a “Sibéria”, mas ainda continua vice), uma alusão a Bolsonaro (“aquele brasileiro presunçoso”) ou o primeiro-ministro com uma agenda errática, como Boris Johnson.
A Kate Wyler de Keri Russell tem que usar sua experiência no underground raiz para sobreviver no traiçoeiro lamaçal por trás dos salões elegantes e palácios centenários, ao mesmo tempo que não sabe ao certo o que fazer com seu casamento de aparências com um marido que admira, mas não confia.
É um seriado adulto no melhor sentido, dentro de um mundo muito mais próximo do real, sem maniqueísmos baratos ou personagens caricatos. Vale conferir.
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