Review | As Viúvas

Alguns diretores são mestres em subverter gêneros ou pelo menos em contar histórias nada convencionais – ainda que com personagens unilaterais. Talvez, atualmente Quentin Tarantino seja o maior representante desta ferramenta e confesso que não sabia que Steve McQueen também tinha essa aptidão – ainda mais depois do engodo 12 Anos de Escravidão, burocrático e oscar bait ao extremo. Porém, ao mesmo tempo em que ele deixa claro que pode ser subversivo, também é visível que parece ter vergonha de assumir esta faceta de quem brinca com gêneros.

As Viúvas é um filme de assalto que nunca se assume como tal. McQueen usa e abusa do melodrama de suas mulheres hipoteticamente empoderadas enquanto cerceia o gênero de assalto em si. O que vemos em tela não passa de um bando de mulheres que aceitam imposições masculinas das maneiras mais absurdas e um grande desperdício de talentos e elenco.

A trama se passa em Chicago, onde quatro mulheres perdem os maridos criminosos após um plano que deu errado. As dívidas deixadas por eles envolvem essas mulheres diretamente na corrida eleitoral do distrito no qual vivem e elas terão que se unir para realizar um último plano para quitar essa dívida e terem suas vidas de volta.

Lideradas por uma Viola Davis presa a uma personagem que serve apenas para entrar em cena com uma fisionomia sofrida e viver às sombras do fantasma do marido, estas mulheres tem dramas pouco explorados por McQueen.

Inexistente

O drama da personagem de Michelle Rodriguez, por exemplo, inexiste. Aliás, sabemos que deve existir algo, principalmente enquanto ela divide os cuidados de seus órfãos com Belle (Cynthia Erivo), até descobrir que esta pode ser peça útil no plano. Elizabeth Debicki é a única delas que tem um desenvolvimento melhor, vivendo entre a cruz e a espada de um relacionamento promíscuo, uma escolha bastante questionável por colocar sua personagem nas mãos de David (Lukas Haas), um retrocesso para o cinema feminino de hoje.

Do lado dos homens, Daniel Kaluuya impõe respeito com sua expressividade marcante, conhecida do grande público desde o episódio 15 Milhões de Méritos, de Black Mirror, e que vem cada vez mais provando ser um excelente ator. Suas aparições são chocantes e fazem As Viúvas ter, enfim, reflexos do gênero em que foi concebido. Robert Duvall mostra que faz muito com poucas falas, enquanto Colin Farrell e Liam Neeson têm aparições rasas e discursos descartáveis que mais inflam a trama do que a deixam interessante.

Ao final fica a impressão de que McQueen desperdiça vários talentos em personagens rasos escorados em uma trama que pincela algumas discussões acerca do feminismo, nepotismo político e violência policial, mas tudo é levado de maneira tão rasa que é até vergonhoso alguém como McQueen se propor a contar uma história dessa, simplesmente pisando em ovos, não por medo de ir afundo em seus temas, mas de se assumir como um mero filme de assalto.

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