O escritor Nick Hornby se especializou em retratar fanáticos por música ou esportes, geralmente homens em crise de meia-idade com personalidades obsessivas. Provavelmente você conhece alguma das adaptações que o cinema fez de seus livros: Um Grande Garoto (2002) e Amor em Jogo (2005) são algumas delas.
Um de seus livros mais famosos é Alta Fidelidade, que inspirou o filme homônimo de 2000, dirigido por Stephen Frears e com John Cusack interpretando um neurótico colecionador de discos frustrado com mais um término de relacionamento e que passa a relembrar das antigas namoradas para descobrir porque com nenhuma delas deu certo.
Dirigido por Jesse Peretz (O Ex-Namorado da Minha Mulher), Juliet, Nua e Crua é a mais nova adaptação de uma obra de Hornby e que novamente conta com um homem de meia-idade apaixonado por música, na verdade, apaixonado pela música de um determinado cantor.
Duncan (Chris O’Dowd, de A Grande Jogada) é um grande fã de Tucker Crowe (Ethan Hawke, de Boyhood: Da Infância à Juventude), um ex-astro do rock que agora vive recluso. Sua devoção é tanta que Duncan tem em sua casa uma parede repleta de recortes de jornais, pôsteres e revistas do ídolo, além de uma enorme coleção de fitas, ainda sendo membro ativo de um fórum da internet onde rolam diversas teorias sobre o paradeiro de Crowe.
A esposa de Duncan, Annie (Rose Byrne, de Vizinhos), desde o início se mostra uma mulher solitária que se dedica ao trabalho burocrático herdado do pai e é deixada de lado pelo marido que só tem olhos e ouvidos para Crowe. Certo dia, uma demo acústica – daí o título “Nua e Crua” – com algumas raridades de Crowe chega pelos correios para Duncan. Annie ouve, para o desespero de Duncan, e a história toma rumos inesperados.
Estudo
Juliet, Nua e Crua funciona como estudo de personagens e de relacionamentos no melhor estilo Noah Baumbach (roteirista de Os Meyerowitz: Família Não Se Escolhe e A Lula e a Baleia). Com foco nos personagens principais, Annie, Duncan e Crowe, três pessoas completamente distintas, fica muito prazeroso para o espectador acompanhá-los em seus dilemas e arrependimentos e notar a forma com que Peretz os conduz e os utiliza com precisão, algo que Baumbach também sempre fez muito bem em seus roteiros e filmes.
No princípio acompanhamos Annie e Duncan, o casal acomodado num casamento frio e sem perspectivas. Depois que conhecemos suas personalidades e suas frustrações, somos apresentados a Crowe, outra pessoa com um passado e escolhas erráticas que refletem no presente – vários filhos de casamentos diferentes e dorme nos fundos da casa da ex-mulher – e que tenta recomeçar uma vida comum ao lado do filho mais próximo.
A escalação de Hawke se mostra uma escolha acertada de Peretz. O ator da trilogia de Antes do Amanhecer constrói com excelência as nuances da personalidade de um ex-rebelde que não leva desaforo pra casa – como na cena do jantar – assim como também se mostra uma pessoa capaz de fazer o mea-culpa e reconhecer seus erros do passado, justamente o que faz Annie se interessar por ele.
Toda a observação que fazemos deste triângulo amoroso rende bons momentos, a maioria deles hilários, como na cena em que Annie vai ao hospital visitar Crowe e pode ser vista no canto com expressões de espanto conforme os inúmeros filhos e ex-esposas do músico vão adentrando o local.
É mais um trunfo de Peretz que não precisa jogar a câmera na cara dos personagens para que prestemos atenção às suas reações. Seu estudo intimista e a construção da personalidade destas pessoas, aliado ao trabalho dos atores, é o suficiente para que possamos compreender suas escolhas, fazendo de Juliet, Nua e Crua uma comédia romântica madura e bastante agradável de se acompanhar.
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