Review | Lovecraft Country (HBO – Episódios 1 a 5)

Após o traumático – em todos os sentidos – final de Game of Thrones, a HBO vem se esmerando nas minisséries, começando logo na sequência com Chernobyl, e no final de 2019, com Watchmen.

Lovecraft Country estreou na quarentena, e ainda não se assumiu como série limitada, mas é o que parece. É baseado em um livro de Matt Ruff, que por sua vez se inspira na mitologia de H.P. Lovecraft, que juto com Edgard Allan Poe e Stephen King forma a Santíssima Trindade do Horror Americano. Tem assinatura tanto de Jordan Peele (Corra! e Nós), quanto de J.J. Abrams (que dispensa credenciais), como produtores executivos. E, já adianto, é mais um triunfo dos dois.

A série, exibida de forma inédita no Brasil todos os domingos às 22h, já está na metade de seus dez episódios, e tem como protagonista Atticus Freeman (Jonathan Majors, de Destacamento Blood e já confirmado como Kang, o Conquistador, em Homem-Formiga 3), um veterano da Coréia que volta para casa, em Chicago, depois de receber uma carta do pai, Montrose (Michael Jenneth Williams, de Olhos que Condenam). Chegando lá, descobre que ele partiu em busca de uma suposta herança familiar.

O tio George (Courtney B. Vance, de American Crime Story: O Julgamento de O.J. Simpson), que escreve guias de viagem para negros (lembra do vencedor do Oscar, Green Book: O Guia?), decide aproveitar o ensejo e levar o sobrinho para reencontrar Montrose. Aos dois se junta a bela Leti Lewis (a Canário Negro de Aves de Rapina, Jurnee Smolett), interesse romântico de Atticus. A partir de agora, SPOILERS.

Invasão

Chtulhu, cuja aparência para Lovecraft, “era tão terrível que palavras não podiam descrever”

As primeiras imagens são um sonho de Atticus, em que ele enfrenta uma invasão alienígena com seu uniforme e equipamento de soldado, e é ajudado por Jackie Robbinson, o primeiro grande ídolo negro das grandes ligas de beisebol a lutar contra o que parece ser o Chtulhu, a grande entidade maligna criada por Lovecraft. Já dá uma ideia do que veremos ao longo da série.

Quando acorda, vemos que ele tem nas mãos A Princesa de Marte, um dos livros da série Barsoon (lembra de John Carter: Entre Dois Mundos?) de Edgard Rice Burroughs (autor de Tarzã), que pode ser considerado um pioneiro da literatura fantástica. George é apaixonado pela esposa Hyppolita (Aunjanue Ellis, de Histórias Cruzadas), uma mulher voluntariosa, e tem uma filha nerd como o primo, Diana.

Leti, por sua vez, é uma garota independente que paga um preço por isso nos moralistas anos 50 e tem uma relação conturbada com os irmãos Ruby (a atriz nigeriana Wunmi Musako, que tem Animais Fantásticos e Onde Habitam no currículo) e Marvin (Demetrius Grosse, de 13 Horas – Os Soldados Secretos de Bengazi).

Embora seja uma só história, ela se divide em subtramas bem definidas que abordam aspectos diferentes do racismo na América e da obra de Lovecraft. O primeiro arco dura dois episódios, que tratam a viagem a Ardham (referência a Arkham, locação fictícia favorita de Lovecraft), a herança de Atticus, em que o terror para os afrodescendentes na época não precisava do sobrenatural: linchamento e perseguição policial eram um cotidiano mostrado com uma brutalidade pouco vista na TV ou cinema.

O casarão se revela a sede de um culto liderado por Titus Braithwhite (o veterano Tony Goldwin, da série Scandal e do clássico Ghost) em que Atticus terá papel relevante por causa de seu sangue, herdado de uma escrava amante do fundador da seita.

O desfecho subverte preceitos de Lovecraft, para quem as ameaças do outro mundo seriam resultado de cultos primitivos trazidos a uma suposta civilização branca por negros, latinos e outras “sub-raças”.

Boêmia

Para afroaamericanos, viajar pelo EUA nos anos 50 era muito mais perigoso do que mostra “Green Book: O Guia”

No terceiro episódio, já de volta a Chicago, Leti recebe uma herança inesperada e compra um casarão abandonado em um bairro exclusivamente branco, e cria uma espécie de república boêmia para artistas negros.

Os vizinhos, obviamente, não gostam, e hostilizam Leti e seus locatários de forma abusiva, sob olhar complacente da polícia. Ao mesmo tempo, os heróis se deparam com assombrações do passado do imóvel, que pertenceu a um cientista que usava afro-americanos como cobaias.

O roteiro aqui se refere a fatos reais, quando negros elevados à classe média no governo Eisenhower foram morar nos subúrbios brancos e enfrentaram o racismo feroz da vizinhança.

O quarto episódio tem nítidas inspirações do cinema de aventura de Spielberg ( a série Indiana Jones e Goonies) e outra marca de Lovecraft, que são subterrâneos que ocultam segredos imemoriais. Aqui a referência histórica é especificamente o extermínio das nações nativas da América pelos brancos.

O quinto e mais recente episódio foca em Ruby – irmã de Leti, como já referido no começo – uma mulher forte e inconformada, que também é cantora (bem boa, aliás) nas horas vagas.

De forma engenhosa, ilustra o racismo para a pele do espectador – seja de que etnia ele for – e acaba sendo representativo com o atual Black Lives Matters, mesmo se passando nos anos 50 do século passado.

Remete de forma gosmenta a outro clássico dos anos 80, Um Lobisomen Americano em Londres. Também descobrimos mais sobre a misteriosa dupla platinada, Christina (Abbey Lee, de Mad Max: Estrada da Fúria) e William (Jordan Patrick-Smith, de Vikings), que vem interferindo na vida de Atticus, Leti, e agora Ruby, desde o começo da viagem a Ardham.

 

[wp-review id=”15473″]

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *