Sean Connery (1930-2020)

“Bond, James Bond”. Com essa apresentação seca como um dry martini, Thomas Sean Connery entrou para a história do cinema como o mais famoso agente secreto de todos os tempos, uma contradição em termos. O primeiro – e para muitos, o único – James Bond do cinema faleceu neste sábado, dia 30 de outubro, aos 90 anos e uma carreira extraordinária.

Ele já tinha dado as caras em O mais longo dos dias (1962), um coadjuvante com falas em meio a um elenco de estrelas que tinha John Wayne, Henry Fonda, Richard Burton e Robert Mitchum. Mas nesse mesmo ano, seria lançado 007 contra o Satânico Dr. No, uma adaptação de um romance de espionagem do inglês Ian Fleming, e que fazia algum sucesso dos dois lados do Atlântico. O criador de Bond o imaginava com uma pinta de aristocrata, mais para David Niven (que acabou estrelando uma espécie de paródia oficial, Cassino Royale, de 1966), e o produtor Albert Broccoli tentou Roger Moore, mas na época ele estava preso por contrato no seriado O Santo.

O desconhecido Connery, um escocês de 32 anos, com 1,88 metro de altura e corpo de fisiculturista (tinha ficado em terceiro lugar numa categoria de Mr. Universo), acabou sendo escalado para o papel. O impacto cultural de seu 007 foi enorme. Criou um novo modelo de masculinidade, que aliava músculos com ternos bem cortados, era mais exigente à mesa (desconfiou do assassino Robert Shaw por que ele pediu peixe com vinho tinto em Moscou contra 007, de 1963) do que na cama (loiras, morenas, negras, japonesas, ciganas, ele ia em todas), lançou moda com a valise que virou equipamento de office boy (a pasta 007) e fez dos carros britânicos Aston Martin objetos de desejo.

A partir de 007 contra Goldfinger (1964), seu melhor trabalho na série, passou a usar peruca, assim como Humphrey Bogart e Fred Astaire, e odiava. Seu sucesso o levou a trabalhar com Alfred Hitchock (Marnie Confissões de uma Ladra, 1964), Brigitte Bardot (Shalako, 1968) e Claudia Cardinale (A Tenda Vermelha, 1969), mas temia nunca mais se descolar do espião com licença para matar.

Deixou seu personagem mais famoso depois de Só se vive duas vezes (1967), voltou por um caminhão de dinheiro em Os Diamantes são Eternos (1971) e depois de novo, em Nunca mais outra vez (1983), uma produção fora da franquia oficial que usava o mesmo enredo de A Chantagem Atômica (1965), cujo único mérito, além da despedida final de Connery de James Bond, foi ter lançado Kim Basinger.

Ao contrário do que temia, sua carreira fora de 007 foi longa e próspera. Entre seus filmes mais memoráveis estão O Assassinato do Expresso do Oriente (1974), a obra-prima de John Huston O Homem que queria ser Rei (1976), Robin e Marian (1976, com Audrey Hepburn), Uma Ponte Longe Demais (1977), Highlander – O Guerreiro Imortal (1986), O Nome da Rosa (1986), Os Intocáveis (1987, com o qual recebeu o Oscar de Ator Coadjuvante), Indiana Jones e a Última Cruzada (1989), A Caçada ao Outubro Vermelho (1990), A Rocha (1996) e Encontrando Forrester (2000). Ou seja, não concordo muito com a lista do Watch Mojo que ilustra esta matéria, mas serve como uma amostra da carreira de Sean Connery.

Aos 69 anos, em Armadilha (1999), ainda teve fôlego para ser par romântico de uma muito mais jovem Catherine Zeta-Jones (tudo bem que ela já estava casada com Micjael Douglas) e se despediu oficial e melancolicamente do cinema com A Liga Extraordinária (2003).

Defensor da autonomia da Escócia em relação ao Reino Unido, recebeu o título de Cavaleiro do Império Britânico. Já aos 59 anos foi eleito pela People’s Magazine como o Homem mais Sexy do Mundo e dez anos depois, a mesma revista o nomeou o Mais Sexy do Século XX.

Não dá para dizer que alguém que morre aos 90 anos, rico, lendário e aposentado há 17 anos possa ser uma perda. Mas o obituário é uma forma e homenagear uma obra, então fica aqui a do Nerd Interior para um dos atores mais marcantes da segunda metade do século passado.

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