Review | O Urso do Pó Branco

O fascínio humano pelo estranho, diferente, bizarro, é algo que acompanha sua evolução enquanto espécie. Desde os primórdios, lá nas cavernas, quando nossos antepassados se encantavam com o sol, a chuva e os demais fenômenos naturais dos quais eles não tinham ideia. Passando por tempos onde anões e pessoas com deformidades corporais eram tratadas como atrações de circo. Até hoje, quando… bom, olha aí o que tem viralizado e você vai entender.

No entanto, nada disso deixou de ser algo real. E essa é outra característica que atrai a atenção dos mais curiosos – e daqueles nem tanto assim. Prova disso é que sempre que um letreiro “baseado em fatos reais” surge na tela de uma produção audiovisual, nossas sinapses se intensificam e nossa atenção é capturada instantaneamente.

Basta ver a recente onda de produções baseadas na vida de serial killers que tem arrastado legiões de espectadores nos cinemas e serviços de streaming mundo afora.

Agora, imagine unir, em um só produto, esses dois grandes atrativos. Parece uma receita de sucesso, não é mesmo? Foram o que pensaram os produtores de O Urso do Pó Branco (Cocaine Bear, EUA, 2023) ao se depararem com a história de um urso que teve um ataque de fúria após consumir uma boa quantia de cocaína na floresta.

Em que poderia resultar tudo isso?

A HISTÓRIA REAL E A FICÇÃO

Em 1985, um avião carregado de cocaína caiu em algum lugar remoto na floresta da Geórgia. Com mais de 200 quilos de drogas e uma grande quantidade de dinheiro potencialmente perdidos para sempre, os donos, um grupo de criminosos, decidiram jogar pelo seguro e não assumir nenhum risco.

Porém, durante a busca pela valiosa substância, eles descobriram que alguém foi mais rápido do que eles – um enorme urso preto encontrou a cocaína primeiro e ficou completamente drogado.

Turistas, adolescentes, policiais e até mesmo os criminosos em questão, acabam indo parar na mira do animal drogadaço. Agora, a única opção é sobreviver e esperar que o urso vá embora. Mas, infelizmente, ele desenvolveu um gosto pela substância e quer mais e mais do pó branco.

Essa bizarrice toda é um breve resumo do filme, dirigido por Elizabeth Banks e que conta com nomes como Keri Russell, O’Shea Jackson Jr., Christian Convery e o saudoso Ray Liotta (em seu último papel completo antes da recente morte) no elenco.

Vale ressaltar que tudo isso é baseado em uma história real digna de uma viagem de LSD, ocorrida na década de 80 – tal qual é retratada no filme. 

De maneira resumida, tudo aconteceu assim: em setembro de 1985, o traficante Andrew Thornton jogou parte de sua carga de cocaína fora de um avião em movimento enquanto acreditava estar sendo seguido pela polícia. 

Meses depois, em dezembro, um urso negro foi encontrado morto na Floresta Nacional Chattahoochee, aparentemente com uma overdose de cocaína, que se acredita ser a carga descartada por Thornton.

O urso foi empalhado e maravilhosamente apelidado de “Pablo Escobear” ou “Cokey the Bear”. Se tem um feito pelo qual eu gostaria de ser lembrado em minha vida, é ter dado esses apelidos ao ursinho cheirão.

Dado esse background estranhíssimo, o que dizer do filme d’O Urso do Pó Branco em si?

SYFY DE ALTO ORÇAMENTO

Quem quer brincar de esconde-esconde com O Urso do Pó Branco?

A comédia escrachada com pitadas de terror trash é, assumidamente, um filme B. Dito isso, não espere mais do que essa simples definição pode oferecer.

Estão lá nas cenas gore, piadas absurdas, personagens que entram em cena apenas para se tornarem vítimas do urso drogradicto.

Tecnicamente, o filme deixa a desejar em diversos momentos, com efeitos especiais duvidosos em algumas cenas. Também incomodam um pouco certas escolhas de fotografia, que alternam entre bons momentos e outros terríveis. Talvez uma escolha por um filtro que remetesse mais à década em que se passa a película, ajudasse inclusive na questão de caracterização.

A direção é competente, e por momentos arrisca alguns movimentos de câmera interessantes. O mesmo não podemos dizer da trilha sonora, altamente esquecível – levando em consideração que se tratam dos anos 80, um período musicalmente cativante como poucos foram.

No entanto, O Urso do Pó Branco é uma aventura divertida de se acompanhar. Os personagens, caricatos, são fáceis de se interessar e torcer para que sobrevivam – ou morram da maneira mais terrível possível. Mortes essas que, divertidíssimas, cruéis e sanguinolentas, satisfazem em um grau bastante alto.

Pode incomodar também o fato do nosso Ursinho Pó não ser o personagem central por grande parte da duração do filme, funcionando mais como um link a todos os pequenos núcleos que o compõem.

Mas aí vai muito da sua expectativa com a história de um urso que achou uma bolsa de drogas e se entupiu com elas, compartilhando-as, inclusive, com seus pequenos. Sinto cheiro (opa) de franquia.

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